PEDAGOGIA DA RESISTÊNCIA – O ENSINO-APRENDIZAGEM ANTIRRACISTA NA PERSPECTIVA DA “TEORIA ENCARNADA” DE GLORIA ANZALDÚA E DA “EPISTEMOLOGIA DA EXPERIÊNCIA VIVIDA” DE PATRICIA HILL COLLINS
DOI:
https://doi.org/10.56238/ERR01v10n6-020Palavras-chave:
Pedagogia da Resistência, Ensino-aprendizagem Antirracista, Gloria Anzaldúa, Patricia Hill CollinsResumo
O presente artigo propõe uma reflexão sobre o ensino-aprendizagem antirracista como prática de resistência e reexistência, articulando os fundamentos da “Teoria Encarnada” de Gloria Anzaldúa e da “Epistemologia da Experiência Vivida” de Patricia Hill Collins. Em tempos de intensificação das desigualdades e do avanço de discursos desumanizadores, pensar a pedagogia da resistência significa reconhecer o corpo, a dor e a memória como espaços de produção de saberem insurgentes. Gloria Anzaldúa concebe o corpo como território liminar onde se cruzam fronteiras culturais, espirituais e políticas, fazendo da vivência encarnada um ato de criação epistemológica. Patricia Hill Collins, por sua vez, afirma que o conhecimento situado nas experiências das mulheres negras constitui uma epistemologia própria, ancorada em práticas de cuidado, diálogo e solidariedade. Nesse diálogo entre corpo e experiência, o ensino-aprendizagem antirracista emerge como ato político de descolonização do currículo e de reumanização das relações pedagógicas. O objeto central deste artigo é compreender como as epistemologias de Gloria Anzaldúa e Patricia Hill Collins podem fundamentar uma pedagogia da resistência voltada à construção de práticas educativas antirracistas, sensíveis à corporeidade, à interseccionalidade e à pluralidade de saberes. A investigação parte da seguinte pergunta: de que modo a “teoria encarnada” e a “epistemologia da experiência vivida” podem transformar o ensino-aprendizagem em um processo crítico, afetivo e emancipatório na luta contra o racismo e as opressões interseccionais? Teoricamente, fizemos uso central dos trabalhos de Collins (1999; 2004; 2009; 2012; 2019) e Anzaldúa (2002; 2009; 2015; 2022), orbitando com os trabalhos de hooks (2003; 2009; 2013; 2015; 2018), Freire (1992; 2014a; 2014b; 2014c), Berila (2016), Dei (2014), Kendi (2019), Ribeiro (2019), Gomes (2017; 2019; 2021), Santos et al. (2022), entre outros. A pesquisa é de cunho qualitativa (Minayo, 2007), descritiva e bibliográfica (Gil, 2008) e com o viés analítico compreensivo (Weber, 1949). Os achados da pesquisa revelam que a integração entre a teoria encarnada de Gloria Anzaldúa e a epistemologia da experiência vivida de Patricia Hill Collins permite repensar o ensino-aprendizagem como prática de libertação e reumanização. Identificou-se que o corpo e a experiência são fontes legítimas de saber, capazes de romper com a lógica eurocêntrica e tecnocrática da educação. A afetividade, o cuidado e o diálogo emergem como dimensões políticas do ato de ensinar, possibilitando o reconhecimento das múltiplas vozes silenciadas. Além disso, constatou-se que metodologias centradas na escuta, na narrativa e na corporeidade favorecem a construção de um currículo antirracista e interseccional. Por fim, compreende-se que a pedagogia da resistência transforma a sala de aula em um espaço ético de reconstrução coletiva do saber e da esperança.
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