ENTRE O AMOR E O ESGOTAMENTO – AFETOS, CUIDADOS E RESISTÊNCIAS NA MATERNIDADE SOLO DE CRIANÇAS AUTISTAS NA INCLUSÃO ESCOLAR
Palavras-chave:
Maternidade Solo, Inclusão Escolar, Autismo, Trabalho do CuidadoResumo
A maternidade solo de crianças autistas, no contexto da inclusão escolar, inscreve-se em um cenário marcado por tensões estruturais, afetivas e institucionais. De um lado, políticas públicas e discursos normativos afirmam o direito à educação inclusiva; de outro, persistem práticas escolares excludentes, fragilidades na formação docente, escassez de redes intersetoriais de apoio e a responsabilização quase exclusiva das mães pelo acompanhamento pedagógico, terapêutico e emocional de seus filhos. Nesse contexto, o cotidiano dessas mulheres é atravessado por uma sobreposição contínua de cuidados, negociações com a escola, enfrentamento do capacitismo institucional e gestão do sofrimento psíquico, produzindo uma experiência ambivalente situada entre o amor, a resistência e o esgotamento. O objeto deste estudo consiste na análise das experiências de maternidade solo de mulheres mães de crianças autistas no processo de inclusão escolar, com foco nos afetos mobilizados, nas estratégias de cuidado e nas formas de resistência construídas frente às exigências escolares, às lacunas das políticas públicas e às desigualdades de gênero que atravessam o trabalho do cuidado sob o olhar de teóricos clássicos e contemporâneos. A pesquisa orienta-se pela seguinte pergunta de partida: como as mães solo de crianças autistas vivenciam, significam e tensionam os processos de inclusão escolar, articulando afetos, práticas de cuidado e estratégias de resistência diante das exigências institucionais e das condições materiais que atravessam seu cotidiano a partir do olhar de teóricos clássicos e contemporâneos? Teoricamente foram utilizados os trabalhos de Badinter (1985), Bourdieu (1989; 2001; 2012), Boyd (2013), Collins (2009), Freire (1992; 2014a; 2014b; 2014c), Grinker (2008), Lacan (2001; 2017), Lamott (2011), Machin (2018), Milton e Ryan (2022), Mitchell (2007), Mont (2001), Moore (2012), Naseef (2012), Robison (2013), Scheuermann, Webber e Lang (2008; 2019), Stock Kranowitz (2006), Suskind (2014), Werneck (1997), Winnicott (1964; 1975; 1988; 1990; 1999; 2005; 2021), Zoja (2001), entre outros. A pesquisa é de caráter qualitativo (Minayo, 2007), descritivo e bibliográfico (Gil, 2008) e com o viés analítico compreensivo (Weber 1949). Os achados evidenciam que a inclusão escolar de crianças autistas, quando vivida a partir da maternidade solo, é sustentada por um intenso trabalho de cuidado não reconhecido institucionalmente, marcado por sobrecarga emocional, responsabilização feminina e lacunas das políticas públicas. As mães mobilizam afetos como força de sustentação cotidiana, transformando o cuidado em prática política diante da negligência escolar e estatal. O estudo revela que essas mulheres produzem saberes, estratégias de resistência e formas de agência que tensionam o discurso normativo da inclusão. Ao mesmo tempo, explicita-se a presença de capacitismo institucional e a naturalização do esgotamento materno como condição de funcionamento da inclusão. Assim, a maternidade solo emerge como espaço de denúncia, reinvenção e produção crítica de justiça social no campo educacional.