A SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO EM PERSPECTIVA CRÍTICA: PERMANÊNCIA, TRANSFORMAÇÃO OU ESGOTAMENTO NO DIREITO ADMINISTRATIVO CONTEMPORÂNEO
DOI:
https://doi.org/10.56238/arev7n12-284Palavras-chave:
Direito Administrativo, Interesse Público, Governança Pública, Inteligência Artificial, SustentabilidadeResumo
O princípio da supremacia do interesse público ocupa posição central na tradição dogmática do Direito Administrativo brasileiro, tendo funcionado historicamente como fundamento legitimador das prerrogativas estatais e da assimetria jurídica nas relações entre Administração Pública e administrados. Contudo, as transformações estruturais do Estado no século XXI, marcadas pela constitucionalização do Direito, pela centralidade dos direitos fundamentais, pela intensificação dos mecanismos de controle, pela emergência da governança pública e pela incorporação de tecnologias digitais e sistemas algorítmicos na tomada de decisão administrativa, impõem uma releitura crítica desse princípio. O presente artigo tem por objetivo analisar se a supremacia do interesse público permanece como pilar estruturante do regime jurídico-administrativo ou se exige uma ressignificação compatível com os paradigmas contemporâneos de governança, inovação e sustentabilidade. Metodologicamente, adota-se uma pesquisa qualitativa, de natureza teórico-analítica e crítico-interpretativa, baseada em revisão bibliográfica especializada, análise normativa e exame de referenciais institucionais sobre governança algorítmica e inteligência artificial no setor público. Os resultados indicam que o princípio não se extingue, mas sofre um processo de transformação, deixando de operar como presunção abstrata de prevalência e passando a exigir construção institucional, fundamentação racional e controle contínuo das decisões administrativas. Conclui-se que a supremacia do interesse público subsiste apenas quando integrada a arranjos de governança democrática, inovação responsável e sustentabilidade, conforme a lógica do Ciclo GIS, sob pena de se converter em retórica legitimadora de decisões opacas e abusivas.
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