PODE O ALUNO AVALIAR? POSSIBILIDADES DE UM GIRO CONTRA-HEGEMÔNICO COMO OPÇÃO DESCOLONIAL NO CAMPO DA AVALIAÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL
DOI:
https://doi.org/10.56238/ERR01v10n7-017Palavras-chave:
Avaliação Participativa, Descolonização, Epistemologias Críticas, Participação EstudantilResumo
O debate contemporâneo sobre avaliação educacional no Brasil tem sido marcado por forte influência de modelos hegemônicos centrados na mensuração, na responsabilização e na lógica de controle, produzindo práticas que, muitas vezes, silenciam a voz dos estudantes e reforçam hierarquias históricas entre ensinar e aprender. Nesse cenário, torna-se urgente problematizar a ausência do aluno como sujeito ativo nos processos avaliativos, reconhecendo que tal invisibilidade está ancorada em uma tradição colonial de conhecimento que trata a avaliação como instrumento disciplinador, e não como prática dialógica. Partindo dessa tensão, o objeto deste artigo consiste em analisar as potencialidades da participação estudantil na avaliação como movimento contra-hegemônico capaz de tensionar a racionalidade tecnocrática vigente e inaugurar possibilidades descoloniais no campo educacional. Assim, a pergunta de partida que orienta o estudo é: em que medida a inserção do aluno como agente avaliador pode promover deslocamentos epistemológicos e políticos que contribuam para uma avaliação mais democrática, dialógica e descolonial nas escolas brasileiras? A partir dessa problematização, o artigo examina fundamentos teóricos, experiências emergentes e efeitos possíveis dessa reconfiguração, compreendendo a avaliação como território de disputa e de construção coletiva do conhecimento. Teoricamente, fizemos uso das obras de Angelo & Cross (1993), Apple (2001; 2019), Ball (2005; 2007; 2008), Boaventura de Sousa Santos (2002; 2006; 2013; 2014; 2019), Brookfield (2017), Darling-Hammond (2010), Dardot & Laval (2016), Fanon (2008; 2022), Freire (1979; 1992; 2014a; 2014b; 2014c; 2014d), Giroux (1997; 2011; 2022; 2024), Habermas (1972; 2003), Laclau (1990), McLaren (1994; 1997; 2000; 2005; 2014), Mignolo (2010; 2012a; 2012b), Quijano (2000; 2020), Santomé (2003), hook (1994; 2003), Tuhiwai Smith (2007), Walsh (2013; 2019), Wiliam (2011), entre outros. A pesquisa é de caráter qualitativo (Minayo, 2007), descritiva e bibliográfica (Gil, 2008) e com o viés analítico compreensivo (Weber, 1949). Os achados indicam que, no plano teórico-conceitual, a participação estudantil reconfigura a avaliação ao deslocá-la de uma lógica centrada na mensuração para uma perspectiva dialógica que valoriza a produção compartilhada de sentidos. A análise das obras examinadas demonstra que práticas participativas operam como gestos contra-hegemônicos capazes de desafiar a racionalidade tecnocrática e os dispositivos coloniais que historicamente organizaram o campo avaliativo. Verifica-se, ainda, que esse movimento potencializa a emergência de epistemologias desobedientes, ampliando a autonomia intelectual dos estudantes e fortalecendo vínculos pedagógicos mais horizontais. Ademais, os referenciais teóricos analisados convergem ao apontar que a participação ativa do aluno desestabiliza hierarquias escolarizadas naturalizadas, abrindo espaço para formas mais colaborativas de construção do conhecimento. Assim, a pesquisa evidencia que a avaliação participativa constitui um horizonte descolonial promissor para a democratização das práticas educativas no Brasil.
Downloads
Referências
APPLE, M. W. Educação e poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.
APPLE, M. W. Ideologia e currículo. Porto Alegre: Artmed, 2019.
BALL, S. J. Education policy and social class. London: Routledge, 2005.
BALL, S. J. Education plc: understanding private sector participation in public sector education. London: Routledge, 2007.
BALL, S. J. The education debate. Bristol: Policy Press, 2008.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, B. A crítica da razão indolente. São Paulo: Cortez, 2002.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, B. A gramática do tempo. São Paulo: Cortez, 2006.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, B. Pela mão de Alice. São Paulo: Cortez, 2013.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, B. Epistemologias do sul. São Paulo: Cortez, 2014.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, B. O fim do império cognitivo. São Paulo: Autêntica, 2019.
BROOKFIELD, S. Becoming a critically reflective teacher. New York: Jossey-Bass, 2017.
CROSS, K. P. Classroom assessment techniques. San Francisco: Jossey-Bass, 1993.
DARLING-HAMMOND, L. The flat world and education. New York: Teachers College Press, 2010.
DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo. São Paulo: Boitempo, 2016.
DOS SANTOS, A. N. S. et al. Entre Palavras e Ações – os saberes da “pedagogia da autonomia” de Paulo Freire para transformar o ensino em prática viva. ARACÊ, [S. l.], v. 7, n. 2, p. 6812-6841, 2025. DOI: 10.56238/arev7n2-135. Disponível em: https://periodicos.newsciencepubl.com/arace/article/view/3301. Acesso em: 04 nov. 2025.
DOS SANTOS, A. N. S. et al. A convergência entre os ensinamentos de Paulo Freire e os princípios da educação decolonial: caminhos para a emancipação e resistência ao colonialismo educacional. ARACÊ, [S. l.], v. 7, n. 2, p. 4914-4945, 2025. DOI: 10.56238/arev7n2-024. Disponível em: https://periodicos.newsciencepubl.com/arace/article/view/3131. Acesso em: 04 nov. 2025.
DOS SANTOS, A. N. S. et al. Descolonizando a avaliação educacional – desobediência epistêmica, ecologia de saberes e experiências encarnado-territorial. ARACÊ, [S. l.], v. 7, n. 5, p. 28027–28077, 2025. DOI: 10.56238/arev7n5-408. Disponível em: https://periodicos.newsciencepubl.com/arace/article/view/5466. Acesso em: 04 nov. 2025.
DOS SANTOS, A. N. S. et al. Currículo escolar como espaço em disputa – educação ambiental e saberes de povos originários e comunidades tradicionais. ARACÊ, [S. l.], v. 7, n. 5, p. 24937–24981, 2025. DOI: 10.56238/arev7n5-230. Disponível em: https://periodicos.newsciencepubl.com/arace/article/view/5130. Acesso em: 04 dez. 2025.
DOS SANTOS, A. N. S. et al. Educação Decolonial – saberes insurgentes do “sul global” e o giro decolonial como horizonte para a transformação crítica da educação contemporânea. ARACÊ , [S. l.], v. 7, n. 5, p. 23308-23349, 2025. DOI: 10.56238/arev7n5-140. Disponível em: https://periodicos.newsciencepubl.com/arace/article/view/4975. Acesso em: 04 nov. 2025.
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
FANON, F. Os condenados da terra. São Paulo: Boitempo, 2022.
FELIPPE, J. N. de O. et al. Por uma educação do afeto: construindo “comunidades pedagógicas em sala de aula” para transpor o sensível para uma educação transformadora com bell hooks. Caderno Pedagógico, 22(1), e13578. Disponível em: https://doi.org/10.54033/cadpedv22n1-219 Acesso em 04 nov. 2025.
FELIPPE, J. N. de O. et al. A educação, o educador e o educando – A construção da autoestima positiva do discente negro a partir do olhar de Lélia Gonzalez e Bell Hooks. OBSERVATÓRIO DE LA ECONOMÍA LATINOAMERICANA, 23(11), e12224. Disponível em: https://doi.org/10.55905/oelv23n11-072 Acesso em 04 nov. 2025.
FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2013.
FREIRE, P. Ação cultural para a liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
FREIRE, P. Pedagogia da esperança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014a.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2014b.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014c.
FREIRE, P. Extensão ou comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014d.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 2008.
GIROUX, H. A. Pedagogia e política da esperança. Porto Alegre: Artmed, 1997.
GIROUX, H. A. On critical pedagogy. New York: Bloomsbury, 2011.
GIROUX, H. A. Neoliberalism’s war on higher education. Chicago: Haymarket, 2013.
GIROUX, H. A. Pedagogy of resistance. New York: Bloomsbury, 2022.
GIROUX, H. A. Teachers as intellectuals. New York: Bloomsbury, 2024.
HABERMAS, J. Knowledge and human interests. Boston: Beacon Press, 1972.
HABERMAS, J. The theory of communicative action: lifeworld and system. Boston: Beacon Press, 2003.
HOOKS, b. Teaching to transgress. New York: Routledge, 1994.
HOOKS, b. Teaching community. New York: Routledge, 2003.
JAHNKE, J. F. et al. Currículo em (re)construção – a reinvenção curricular como eixo estratégico da nova Política Nacional de EaD, suas exigências formativas, limites da flexibilidade pedagógica e os desafios para garantir inclusão acadêmica. REVISTA DELOS, 18(71), e6640. Disponível em: https://doi.org/10.55905/rdelosv18.n71-088 Acesso em 04 nov. 2025.
LACLAU, E. New reflections on the revolution of our time. London: Verso, 1990.
LACLAU, E.; MOUFFE, C. Hegemony and socialist strategy. London: Verso, 2001.
MCLAREN, P. Life in schools. New York: Routledge, 1994.
MCLAREN, P. Critical pedagogy and predatory culture. New York: Routledge, 1997.
MCLAREN, P. Che Guevara, Paulo Freire and the pedagogy of revolution. New York: Rowman & Littlefield, 2000.
MCLAREN, P. Capitalists and conquerors. Lanham: Rowman & Littlefield, 2005.
MCLAREN, P. Life in schools. 6. ed. New York: Routledge, 2014.
MIGNOLO, W. Desobediencia epistémica. Buenos Aires: Ediciones del Signo, 2010.
MIGNOLO, W. Local histories/global designs. Princeton: Princeton University Press, 2012a.
MIGNOLO, W. The darker side of Western modernity. Durham: Duke University Press, 2012b.
MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento. São Paulo: Hucitec, 2007.
QUIJANO, A. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. Buenos Aires: CLACSO, 2000.
QUIJANO, A. Cuestiones y horizontes. Buenos Aires: CLACSO, 2020.
SANTOMÉ, J. T. A educação em tempos de neoliberalismo. Porto Alegre: Artmed, 2003.
SANTOS, A. N. S. dos. et al. Descolonizando saberes: a busca pela revolução contra-hegemônica da educação latino-americana no contexto contemporâneo. Cuadernos De Educación Y Desarrollo - QUALIS A4, 16(6), e4636. Disponível em: https://doi.org/10.55905/cuadv16n6-178 Acesso em 04 nov. 2025.
SANTOS, A. N. S. dos. et al. Educação decolonial: desafios epistêmicos e a luta contra o eurocentrismo, patriarcado e capitalismo na contemporaneidade. Caderno Pedagógico, 21(10), e9101. Disponível em: https://doi.org/10.54033/cadpedv21n10-142 Acesso em 04 nov. 2025.
SANTOS, A. N. S. dos, Lutzer, A. V. B., Muller, A. A., Kehler, G. dos S., Maia, N. D., Maia, M. D., & Araujo, A. S. de. (2024). Epistemologia do Sul, pós-colonialismo e descolonialidade: explorando afinidades e divergências sob o olhar de Boaventura de Sousa Santos. Caderno Pedagógico, 21(10), e9586. Disponível em: https://doi.org/10.54033/cadpedv21n10-277 Acesso em 04 nov. 2025.
SANTOS, A. N. S. dos. et al. Educação decolonial: desafios epistêmicos e a luta contra o eurocentrismo, patriarcado e capitalismo na contemporaneidade. Caderno Pedagógico, 21(10), e9101. Disponível em: https://doi.org/10.54033/cadpedv21n10-142 Acesso em 04 nov. 2025.
SANTOS, A. N. S. dos. et al. “Educação comprometida”: a práxis pedagógica crítica, libertária e engajada sob a lente de Bell Hooks. Caderno Pedagógico, 21(10), e8633. Disponível em: https://doi.org/10.54033/cadpedv21n10-043 Acesso em 04 nov. 2025.
SMITH, L. T.; TUCK, E.; YANG, W. Indigenous and decolonizing studies in education. New York: Routledge, 2019.
TUHIWAI SMITH, L. Decolonizing methodologies. London: Zed Books, 2007.
SPIVAK, G. C. Can the subaltern speak? Berkeley: University of California Press, 1988.
STAKE, R. E. Qualitative research. New York: Guilford Press, 2011.
WALSH, C. Interculturalidad y colonialidad del poder. Quito: Abya-Yala, 2013.
WALSH, C. Pedagogías decoloniales. Quito: Abya-Yala, 2019.
WILIAM, D. Embedded formative assessment. Bloomington: Solution Tree Press, 2011.
WEBER, M. A objetividade do conhecimento nas ciências sociais. São Paulo: Cortez, 1949.